- Data de validade
Na casa de amigos, o filho criança deles aponta uma prateleira com bebidas e diz que a maioria está com data de validade vencida. Criado num tempo quando as coisas expiram, o menino acredita que uísque e vinho têm o mesmo destino. Na cabeça infantil, não cabe que uma bebida seja considerada mais qualificada pelos anos que tem. Afinal, leite, remédios, pão e mais em volta do garoto possui uma data de validade que excedida condena o uso do produto.
Houve um tempo quando muitas mercadorias eram armazenadas para consumo posterior e pouco se dava importância ao prazo de validade que raramente vinha no invólucro. Na época da inflação alta - muita gente esquece ou não viveu, mas um produto podia ter um preço de manhã, outro, à tarde e custar mais caro ainda de noite – eram os tempos inflacionários quando se fazia necessário estocar gêneros alimentícios e outros artigos para preservar o desvalorizado salário.
O cidadão também tem prazo de validade nos documentos: habilitação, passaporte e a carteira de identidade (ou RG de Registro Geral) não é aceita para entrar na Argentina se tiver mais de 10 anos de expedição. Às vezes, se a foto não retratar fielmente o portador do documento que envelheceu, por exemplo, a identidade é rejeitada. Certa vez, houve confusão no aeroporto Antônio Carlos Jobim porque uma pessoa queria embarcar para São Paulo com uma carteira de motorista com data de validade vencida. O cidadão alegou que não podia dirigir automóvel com o documento, mas poderia se identificar sim. O rolo chegou à Justiça, foi discutido na mídia e parece que ficou assim: habilitação vencida identifica o portador embora não o permita dirigir.
Há quem considere a data de validade uma imposição e não a compreenda. Afinal, como se fazia nos tempos quando não era obrigatório o prazo de validade nos produtos? O argumento de quem apoia a medida é que se consumia coisas estragadas que ameaçavam a saúde. O que é verdade. O respeito ao consumidor fez com que o prazo de validade se estabelecesse e com realce no que virá a ser consumido. Por causa do prazo de validade, o consumidor está a salvo de pagar por algo que não poderá consumir ou, se o prazo para o consumo estiver esgotado, não se desmanchará na hora do uso.
Mas o menino achou que vinhos e uísques também devem obedecer a esse critério o que não é verdade. Um uísque 12 anos, por exemplo, é mais valorizado do que o que saiu da fábrica agora. Com o tempo, ele aprenderá essa diferença e saberá que há certas coisas que se valorizam pelo tempo passado. Nem tudo deve ser consumido imediatamente para que o prazo de validade não vença.
Tomara que um dia, brasileiros que envelheceram sejam valorizados e não vistos como estorvos ocupando espaços que não lhe pertencem mais ou prejuízo para o governo com suas aposentadorias ou suas pensões.
Mas aí é um outro assunto que essas reformas na Previdência patrocinadas pelos governos que se sucedem impõem. Uma insistência dos governantes e de seus economistas em colar nos que envelheceram um prazo de validade cada vez mais curto.
